domingo, 13 de outubro de 2013

A morte barroca na cidade da Bahia colonial

Johann Morittz Rugendas. Enterro de um negro na Bahia, c. 1830. 

As atitudes dos soteropolitanos com relação à morte levam, até meados dos Oitocentos, a uma familiaridade entre vivos e mortos, expressa nos sepultamentos no interior ou em torno das igrejas. Os frequentadores dos templos católicos  pisavam, caminhavam, sentavam e oravam sobre as sepulturas, o que acabava por resultar um convívio cotidiano entre os fiéis e seus mortos. Neste século, Salvador viveu momentos de tensão diante de determinações legais para que os sepultamentos passassem a ocorrer em cemitérios. Forte reação popular ocorrida em 1836, conhecida como Cemiterada, acabou por adiar essa transferência, que só foi totalmente concretizada na década de 1850, com o advento da epidemia do cholera morbus.
Mas, o que ocorreu, em especial no século XIX, que venha a justificar um estudo das atitudes dos baianos de Salvador perante a morte? O que sinaliza, na nossa história, para a origem da postura distanciada que hoje cultivamos diante da morte?  Como passamos da relação de intimidade com os mortos para o estágio que Nobert Elias denominou de “solidão dos moribundos”, ao referir-se à incapacidade dos vivos em demonstrar afeto por seus mortos? [1] 
     Sabemos que as atitudes mentais e os comportamentos coletivos, bem como as visões do mundo que os determinam, não se transformam bruscamente e nem de modo definitivo. Quase sempre se trata de um processo gradual, embora este ritmo possa ser afetado por alterações repentinas das estruturas materiais.
            É certo que a relação de proximidade entre mortos e vivos, as pompas e os rituais fúnebres predominaram na cidade em períodos anteriores aos Oitocentos.  A estas práticas Michel Vovelle[2] (1991, p. 353) chamou de “morte barroca”, como expressão do cerimonial fúnebre composto por “morte preparada, temida, exercício de toda uma vida, dando lugar a um cerimonial público e ostentatório, seguido de todo um conjunto de ritos e prestações destinadas, pelas obras, pelas missas e orações, a assegurar a salvação ou a redenção a termo dos pecados do defunto”. Portanto, faz-se obrigatório, ao empreender este estudo, debruçar-me sobre a história do período colonial da cidade do Salvador.



[1] ELIAS, Norbert. A Solidão dos  Moribundos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2001.
[2] VOLVELLE, Michel 1991 ideologias e mentalidades. São Paulo, Brasiliense.         

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